Gestos e movimentos da nossa liberdade - Parte 2 do "Corpo de Carne" de X. Lacroix



A finalidade do autor é pensar uma ética possível dos atos carnais, pensar o seu sentido. Para isso, elabora uma crítica das representações redutoras da carne e sua relação com seu espírito, procurando uma dimensão ética do vínculo dos atos carnais, que no fundo revelam uma significação intrínseca de uma experiência interpessoal. Na primeira parte, o autor desenvolve a ideia de uma tentação relativista que leva a leveza e a gravidade, onde o equilíbrio entre as duas é a manifestação estética que faz possível descobrir a significação profunda dos gestos carnais. Na segunda parte, o discurso gira em torno do tema do sentido. Pergunta-se ao mesmo tempo se os gestos da união são uma linguagem e se é possível aí alguma normatividade.
Com base no estudo da tentação relativista da sexualidade redutora, desenvolvida na primeira parte do livro, o autor lança um olhar sobre os argumentos ao respeito do que entende por leveza e gravidade. Explica que o sentido da leveza que se vive na cultura caracteriza-se por uma sexualidade liberada da procriação, da instituição do matrimônio, e da religião, no sentido de que a sexualidade não tem nada de sobrenatural. É interessante como o autor destaca aquilo que, na leveza, o lúdico, como atitude, possibilita a experiência da afirmação da vida, abrindo espaço para a gratuidade. No âmbito da cultura, afirma-se que, pelas facilidades, pela queda da dimensão propriamente erótica e pela banalização, a sexualidade tem caído na insignificância, no hedonismo, no materialismo e na libertação desmedida do corpo. De outra parte, o retorno da gravidade também tem prejudicado a relação erótica, levando-a além da seriedade, e caindo num moralismo que despreza o jogo erótico da sexualidade e abrindo espaços à ambiguidade do Eros, que liberta o pudor, e que, como cuidado do corpo, pede uma qualidade no olhar, que despreza tudo o que se apresenta como obsceno, permitindo com isso abrir as portas para descobrir um elemento ético, na medida em que são sinais da socialização do corpo. Dito de outro forma, abre-se, com o que foi dito anteriormente, uma relação entre o erótico vivido como desejo, gozo e beleza, e a experiência estética, abrindo desta forma a passagem ao elemento ético do encontro com o outro.
Na segunda parte, apresenta-se o corpo como expressão, e se faz primeiro um estudo fenomenológico dos gestos carnais, para procurar depois a sua significação e seu sentido. Assume-se, no início, que a união carnal é uma conduta, uma maneira de ser própria da dimensão expressiva da pessoa, onde todo gesto tem o seu significado. Mas, se reconhece também que os gestos da carne manifestam a sua fraqueza na medida em que a consciência tem pouco domínio sobre eles, pois revelam o sujeito, a verdade de seu corpo e seu desejo. Assim, o autor analisa a carícia, o abraço, o beijo, a penetração e o orgasmo. Sobre a carícia, afirma que é o passeio das mãos, e que no seu dinamismo se revela a presença e a ausência, que se manifesta como promessa do outro que é intangível, dando lugar ao surgimento da espera daquele que está por vir, o seu tempo, e ao desejo da duração. Sobre o abraço, a ideia central gira em torno ao desejo de acolher ao outro que se entrega, mas a ambivalência do abraço se evidencia na captura do outro, no controle dos movimentos do outro. O beijo, pela significação da boca, revela o desejo de dar e receber a vida que entra pela boca, mostrando, no entanto, que pela boca também se expressa o desejo de devorar o outro. Da penetração, afirma-se que esconde o desejo de ser incluído no mundo íntimo do outro com a sua permissão e não pela violência ou a invasão que mata o desejo; mostrando também o jogo expansivo da abertura extrovertida do homem e da mulher introvertida e recolhedora que se abre, se nutre e se enriquece. Finalmente, é o orgasmo, onde a linguagem se malogra e se revela a vulnerabilidade de acabar nas mãos do outro abrindo espaço para algo novo. Depois, na procura da significação dos gestos da carne, passa-se da relação ao vínculo: 1) Tornar-se um, onde a escolha de unificação é a escolha ética, fazendo possível a resposta ao apelo do outro; 2) Um sentido vindo do outro, que reconhece que o outro dá sentido a meu corpo, fazendo com isto o desejo de ser para o outro, dando lugar ao sentido ético na medida em que aparece a responsabilidade pelo outro; 3) Na integração o sentido da união tem a ver com a duração, a abertura à fecundidade, e a pertença a um grupo maior, que na ética abre espaço para a fidelidade, a fecundidade do filho como manifestação objetiva e transcendente da relação, e para reconhecimento de que não estamos sós no mundo.
Concluindo, gostaria de destacar a forma como o autor vai descobrindo os elementos éticos dos atos carnais, na medida em que eles possibilitam o encontro com o outro, implicando também uma forma de abrirmos mão daquilo que muitas vezes gostaríamos que fosse eterno e só para nós. No fundo, parece que as nossas necessidades eróticas e de amor são uma resposta a um conjunto de normas implícitas na medida em que somos também seres com capacidade de socializar e de agir segundo os movimentos da nossa liberdade. (síntese por Edwin, aluno).

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