LIMITE, FRAGILIDADE E TRANSCENDÊNCIA


A relação entre a materialidade da carne (sarx) e a carne inspirada (bāśār) se dá pela possibilidade do psíquico na materialidade do mundo e da carne. Bíblicamente, isto é possível pelo dom do sopro do Ruah. Logo, se estabelece uma relação inextrincável entre carne e espírito. Sarx é a mundaneidade da carne, lugar do nosso limite e fragilidade. Somos solidários naquilo que fomos gerados, nesta nossa fragilidade. Mas bāśār traz em si uma ênfase no caráter mais profundo do psiquismo da carne, uma ênfase no sentido, porque tem  relação com o Ruah. Diferentemente, o termo grego tem uma conotação de exterioridade. Vivemos “na carne” porque nosso é o viver no mundo da encarnação ou da finitude do humano, mas, biblicamente, viver “segundo a carne” significa viver desconexo ou em desobediência ao Ruah. Não dar audiência ao espírito que Deus nos deu pelo Ruah é a negação da condição humana de carne psíquica (que se diz na relação com o Ruah de Deus). O lugar da relação entre relação entre sarx  e bāśār é o soma. Soma é o corpo próprio do vivente; ele acontece na medida em que Deus inspira e faz a carne respirar, mas se retira na Sua santidade. Nosso corpo é próprio, é nosso! Nos dá a liberdade circunscrita da matéria na sua relação com o Espírito (autonomia da coisas criadas). Assim, especificamente, o corpo é o lugar da santidade.. É nesse lugar que acontece a personalização, o rosto, porque em relação com os demais humanos, o mundo e Deus. O corpo é a pessoa, lugar de identidade. Interligados sem se confundir, constituindo uma pericorese, estão sarx  (mundandeidade), bāśār (palavra/espírito) e soma (corpo próprio da pessoa; pessoalidade). Assim, é possível que o corpo seja o lugar da santidade, do intercurso/relação com o Santo. Pela palavra/linguagem/espírito, as relações humanas transcendem também a presença imediata da força, da vitalidade, da possibilidade de manipulação, controle e posse do corpo (violência). Esse mesmo fôlego que aponta para a transcendência de nossa fragilidade material, aponta ainda para relações humanas de sentido além da corporalidade, seja ela no âmbito da sexualidade, ou do trabalho, por exemplo.

Simbolismo do Corpo na Bíblia, parte 2

A segunda apresentação está aqui.

A questão do sexual como sagrado

Sobre essa questão, cito Xavier Lacroix: "Em que medida, então, aos olhos do cristão, o sexual pode ser considerado como 'sagrado'? Se certos autores, como Bernard Haring, retomam o termo ao falar de 'domínio sagrado do sexual', para outros, ao contrário, a tradição cristã caracteriza-se por um trabalho de dessacralização da sexualidade. É que as acepções das noções são variáveis. A resposta à questão não será a mesma se 'sagrado' significa simplesmente 'respeitável', irredutível ao estatuto de instrumento, sinal e lugar de uma transcendência ou se o termo é tomado no sentido 'terrificante', interdito, exterior à iniciativa humana, participando diretamente da potência divina. É o primeiro sentido que se trata de elaborar, sem deslizar para o segundo. Sem dúvida, para isso, o termo 'santidade' seria preferível. Tende menos à coisificação e diz melhor a mediação da liberdade do que o termo 'sagrado' que permanece irredutivelmente ambivalente.
(Lacroix, X. O corpo de carne, Loyola, 2009, p. 19-20.)
E formou o SENHOR Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma (nefesh/psyche)  vivente (Gn 2, 7)
Deus cria o ser humano “do pó da terra”. Mas ao criar, a terra estava ainda seca, inóspita e sem alimento (Cf. Gn 2,5). Interessantemente, o SENHOR se prepara para criar a humanidade, plantando de antemão um jardim (Cf. 2,8), indicando o caráter amoroso e relacional da intenção de criar o homem e a mulher. Da mundanidade do mundo (pó e matéria) cria a nossa carne (bāśār; sarx ; corporalidade); carne e corpo modelados na transitoriedade do mundo (finitude). Deus cria bāśār quando sopra o seu Ruah e dá à carne o fôlego (néph); então, bāśār  é carne “com fôlego”; carne viva, cheia de alento, animada. Essa carne animada já é corporeidade, carne e psiquismo, ser/alma vivente (cux®n zÇsan, na LXX), distinto da corporalidade da pura matéria. Assim, não há separação entre carne e espírito no ser humano. A carne é inspirada, e pelo fôlego é dotada de fala e pode nomear todo ser vivente (Gn 2,19). [1]
O ser vivente criado por Deus, porém, está separado dele como de resto toda a criação, que se deu num processo de contínuas separações. Deus, que sopra, não se identifica com o (seu) Ruah; Ele se mantém para aquém da sua ação (de soprar), pois Ele é O Santo, o separado. Deus é “Deus mesmo”, e se mantém na sua santidade como Espírito, mas o Ruah  por ele soprado vai como que animando e inspirando – dando vida - para a santidade, que é estar em relação com o Santo. Portanto, a sexualidade, que pela geração perpetua a humanidade através dos tempos, não é sagrada, mas está referida ao Santo, isto é, está no âmbito da santidade. [2]
A carne psíquica, bāśār, carne que respira (néph), é a possibilidade de que a carne se faça palavra. Palavras proferidas, evocarão a Presença, a relação, a aliança com o Santo. Na tradição bíblica, não há distinção entre a alma e o espírito, o ser criado é cux®n zÇsan [3]. No grego, a alma é o princípio vital e o espírito o lugar da inteligência ou razão. Na tradição judaica, porém, alma e espírito estão integrados. A alma humana é o lugar da Palavra, da linguagem, e sua relação com o psiquismo. O homem é uma carne psíquica e não carne espiritual. A carne não é espiritual, mas animada (inspirada) porque recebeu o sopro de Deus, mas não Deus mesmo. Deus se retirou para aquém do sopro; há aqui uma separação. O Espírito (Deus mesmo) inspira (a carne) pelo Ruah (sopro/hálito/alento/espírito).


[1] O termo grego sarx (s‹rz) designa tão somente “carne”, mas é utilizado na LXX no contexto de bāśār (carne inspirada). Por exemplo, em Gn 2,24: "Portanto deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne."
[2] Para o ser humano, reconhecer que “Deus é Deus”, é reconhecer sua finitude, mas uma finitude amparada desde a origem no desejo e preparação do Santo.
[3] cux®n = alma, vida, “self” ou ser autoreferido; zÇsan = viver.
Em matéria de ética da sexualidade, para significar algo aos homens e mulheres deste tempo, a fé cristã deve trazer um aporte universal sem, no entanto, abrir mão da sua particularidade (as Escrituras, o Cristo, a Igreja). Nos moldes em que se desenrola este curso, trata-se de reconhecer que diante da complexidade da sexualidade humana, o simbólico, que é da ordem da metáfora e do mito, e não da ordem do domínio e da explicação (psicologia, biologia, medicina, antropologia, sociologia, jurisprudência, etc), pode ser um caminho para se propor uma ética cristã da sexualidade. Pressuposto básico para isto, seria mostrar que a sexualidade, na sua complexidade e enigma, é da ordem da afecção, e assim, de ordem pré-científica, pré-linguística e pré-jurídica. Se for assim, o caminho de estudo não é o da conceitualização científica e objetivante, nem o da normatização objetiva e juridicista, mas através da valorização da simbólica como um elemento estruturante da cultura e da ética. Para isso, os cristãos devem recuperar o mito, recuperando a antropologia que ele explicita.


Nota: Este tipo de tematização, recebi a inspiração, recebemos todos, das aulas do honorável prof. Nilo Ribeiro Júnior SJ, da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em 2006 e 2007.
Dentro de ese marco presentado por los artículos, debemos recordar que nuestros imaginarios culturales,[1] como la “pos-modernidad”, nunca son totalmente representativos.  Paglia reconoce que en Estados Unidos, por ejemplo, la sexualidad se vive de modos diferentes dependiendo del grupo social.[2]  En cuanto a América Latina, algunos autores hablan de una cultura “polirrítmica”, en la cual coexisten simultáneamente la pre-modernidad, modernidad y pos-modernidad, incluso dentro de un mismo grupo social o hasta en las actitudes de una misma persona.[3]  Por ejemplo, hay una evidente contradicción entre lo que, por un lado, se manifiesta en la promiscuidad y, por otro lado, la permanencia de tabús a la hora de hablar de la sexualidad.
¿Cómo, entonces, recuperar una sexualidad que integre a la persona en relaciones recíprocas, sin perder los logros de la liberación sexual?  Para pasar de la adolescencia a la madurez adulta, sin caer en las trampas que hemos visto, tenemos que re-articular el sentido de la sexualidad, no como algo totalizado racionalmente, sino manteniendo nuestra capacidad de asombro y dejando espacio al misterio.[4]  Como cristianos, entendemos que la persona de Jesucristo nos puede ayudar a integrar nuestro deseo profundo de disfrutar de la sexualidad como regalo de Dios y como auto-donación a los demás.  La configuración con Cristo solo será auténtica y dadora de vida si se vive desde nuestra propia “encarnación”, asumiendo nuestra humanidad y conociendo la realidad que nos rodea. 
La ventaja de nuestra situación actual, con toda su complejidad, es que se ha abierto una brecha y una búsqueda que nos permiten entablar diálogos y hacer propuestas.


Bibliografia:

ANATRELLA, T.  O sexo esquecido.  Rio de Janeiro: Campus, 1992.

BENITEZ ROJO, A.  La isla que se repite: El Caribe y la perspectiva posmoderna.  Barcelona: Casiopea, 1998.
FREIRE COSTA, J.  “Perspectiva da juventude na sociedade de mercado”.  Em NOVAES, R. e NABNUCHI, P.  Juventude e Sociedade: trabalho, educação, cultura e participação.  São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo/Instituto Cidadania, 2004, p. 75-88.
___________.  “O sexo moderno e a cultura do sentimento”.  Jornal Folha de São Paulo, Caderno MAIS!, 31 de julho de 1994, p. 6-3.
GONZALEZ BUELTA, B.  Orar en un mundo roto: Tiempo de transfiguraciónSanto Domingo: Ed. MSC. Amigo del Hogar, 2002.
JUNGES, M.  “Os comportamentos ligados à sexualidade são históricos”.  IHU On-Line, Ed. 335, 28 de junho de 2010, p. 5-7.
PAGLIA, C.  “Sexo não, por favor, somos classe média”.  New York Times, 26 de junho de 2010.
RICOEUR, P.   A Maravilha, o descaminho, o enigmaPaz e terra, v.1, n.5, 1967, 27-38.
SAFATLE, V.  “Pos-modernidade: utopia do capitalismo”.  Texto adaptado de palestra no encontro “Trópico na Pinacoteca”, 28 de agosto de 2004.



[1] FREIRE COSTA, 2004, p.1.
[2] PAGLIA, 2010.
[3] BENITEZ ROJO, 1998; GONZALEZ BUELTA, 2002.
[4] RICOEUR, 1967.
En el trasfondo de los artículos sobre la vivencia de la sexualidad están los grandes cambios sociales que han afectado tanto a la sexualidad como a otras dimensiones culturales y sociales.  El análisis de estos cambios que hace Zygmunt Bauman[1] nos sirve aquí de marco.
El primer cambio importante fue el de la pre-modernidad a la modernidad.  En la pre-modernidad, por ejemplo en la Cristiandad de la Edad Media, todos los aspectos de la vida – desde la sexualidad hasta el gobierno – están integrados en un sistema total, en el que la religión provee sentido y orden.  Cuando los modernos comienzan a cuestionar la autoridad tradicional de la religión, se desintegra tal sistema.
Por un lado, la modernidad trae una liberación.  Como se des-construyen las categorías que venían del “sistema total”, cada individuo tiene la posibilidad de construir nuevas categorías e identidades.  Sin lugar a dudas, este proceso socava sistemas tradicionales de desigualdad y opresión, como el patriarcado.  A la vez, un enfoque reducido a la “liberación de” se queda en la inmadurez de la adolescencia.[2]
Así, la libertad conlleva responsabilidad.  Ya no heredamos identidades, sino que hay que construirlas.  Al hacernos conscientes de esta tarea, también nos damos cuenta de que las construcciones están marcadas por procesos de negociación y luchas de poder.[3]  Se evapora la ilusión de referencias “metafísicas” independientes de intereses subjetivos.
A quien se queda inseguro con la falta de referencias objetivas de sentido, se le promete (a través de la publicidad capitalista) que la satisfacción del deseo vendrá por el consumo.[4]  Pasamos de la esclavitud a la adicción, pues el capitalismo necesita de – y produce – consumidores con apetitos insaciables (o en otras palabras, permanentemente insatisfechos) para continuar produciendo lucro. 
A medida que este proceso se acelera, entramos en la “pos-modernidad”, o “modernidad líquida”.  El deseo se vuelve cada vez más desenraizado y efímero,[5] hasta ser reemplazado por meros sentimientos pasajeros, incapaces de construir identidades ni relaciones estables.[6]  La sexualidad se confunde con la genitalidad, y esta banalización nos deja en total soledad y afectivamente fragmentados.[7] 
El cuerpo alienado se convierte en “producto” sin historia (es a la vez auto-construcción y auto-negación), “producido” con más o menos éxito mediante cirugías plásticas y gimnasios, todo por satisfacer la idolatría de la belleza y la salud absolutizadas.[8]  Así como el sujeto alienado cosifica su propio cuerpo, también hay personas vulnerables cuyos cuerpos son cosificados y explotados por otros, por ejemplo en la prostitución forzada de niñas y niños.

Por um grupo de alunos da disciplina.

[1] Citado en FREIRE COSTA, 2004, p.4
[2] ANATRELLA, 1992, p.3; 11.
[3] JUNGES, 2010.
[4] SAFATLE, 2004; FREIRE COSTA, 2004.
[5] FREIRE COSTA, 2004.
[6] FREIRE COSTA, 1994, p. 1.
[7] ANATRELLA, 1992, p. 5; FREIRE COSTA, 2004, p. 8.
[8] ANATRELLA, 1992, p. 17.

O simbolismo do corpo na Bíblia - Prezi

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