Esponsalidade e castidade II

A castidade como dinamismo amoroso em Cristo
Aquilo que exprime o mito adâmico em relação à castidade, Cristo o assumiu em relação ao Pai (encarna-se, renuncia a sua divindade) e à sua família em Nazaré para dar-se à sua aliança com a humanidade. O mito crístico plenifica o mito adâmico no sentido de que a entrega de Jesus na ceia pascal (corpo dado para a redenção do gênero humano) é como se fizesse uma aliança definitiva com a humanidade de tal maneira que a nós que somos in-corporados em Cristo. Assim, o cristão, imerso na vida do Cristo, recebe originariamente a castidade como dom em Cristo. Neste sentido, Cristo redime a falta que levou a Adão e Eva quererem ser “como Deus”, isto é, a viver uma relação incestuosa com Deus. Desobedecer é deixar de escutar o inter-dito da separação já dado na criação, na gênese da nossa humanidade. Desobedecer ao Espírito que anima nossa carne, é querer deixar de viver o dinamismo do desejo (amor: eros, filia, ágape) que permite a relação livre e amorosa com o Pai, isto é, a relação de santidade validada pelos pai na ressurreição (vida nova). Assim, a divinização nos vem pela liberdade do Espírito dado pelo Cristo.

A ética cristã da castidade
A castidade é originária, antropológica, ontológica no sentido como está ligada ao dom da criação. Logo é universal. Assim, o sentido da castidade para a salvação faz emergir valores como esponsalidade, fecundidade, hospitalidade e solidariedade, que podem ser assumidos em função da realização da nossa humanidade. A castidade é teleológica e não deixa nos perder na afecção da sensualidade da carne. Como estamos imersos na história, essa plenitude se desenrola numa história da castidade que se mostra no cuidado com o dom (do desejo, de si, do outro), um cuidado com o outro e um cuidado com a sociedade. Como vimos anteriormente, a moralidade da castidade se expressa na normatividade, ou quando se vive a castidade como norma*. A normatividade vem daquilo que se vive numa comunidade de pertença (a Igreja) que concretiza historicamente uma experiência e uma linguagem. A experiência e linguagem nos dão o imaginário cristão da sexualidade. Esse imaginário é o mito crístico da encarnação-redenção-santificação (exposto anteriormente). Quando refletimos sobre a vivência atual da sexualidade, a crítica teológica da moralidade e da própria linguagem da experiência deve partir sempre de uma antropologia que está em função dos pontos fundamentais da fé: CRIAÇÃO, SALVAÇÃO E SANTIFICAÇÃO. Logo, a crítica teológica tem meios de amparar uma normatividade da castidade na comunidade de pertença. E essa normatividade não é espúria (sacralização ou voluntarismo relativista), mas profundamente antropológica. A possibilidade de viver a castidade como norma se expressa no compromisso do celibato.

(*) A norma protege o valor, e o valor é assumido em função da realização de nossa humanidade (expectativas comunitárias de liberdade e realização humana, isto é, a vida ética realiza o dinamismo do Espírito. Tal dinamismo é o dinamismo da carne inspirada, originário-ontológico-antropológico, biblicamente falando)

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